segunda-feira, dezembro 26, 2005



São estes momentos que fazem valer qualquer noite, de qualquer ceia.
Não interessa o que existe na mesa ou por baixo dum pinheiro qualquer.

Seria eu velho das barbas se pudesse para que fosse Natal todos os dias dentro de toda a gente.

Amo-te princesinha** a prima mais linda do mundo é minha!:)

e "façam favor de ser felizes", hoje acabo mesmo em cliché porque já me irrita o fatalismo da data.

25.12.05
*Mó

segunda-feira, dezembro 19, 2005

Venho dentro do carro. Ao volante.
Sozinha. Num sítio qualquer do caminho de sempre.
Está escuro e são horas serenas de fim de tarde tardia.
Já não chove. Ainda faz frio.

Torço o retrovisor e fixo-me de frente – pálida, cerrada, com o negro dos olhos escondido pelo olhar.

Concentro-me em mim.
Revejo-me.

Brahms ouve-se por trás dos meus ritmos, com as partituras das minhas partes mais escuras.
Fecho a luz dos fonemas – concentro-me nas palavras que não digo, e canto. Desligo a música, atraso o ponteiro do relógio, abrando a estrada e volto atrás – sem olhar para trás.

Reajusto o retrovisor e foco os lábios – encerram uma pérola que não encontro, cravados nos segredos que não conto a ninguém, que nem eu quero descobrir.
Escorrego os pés, desvio o caminho. Ao volante, descentralizada do rumo, desencontrada.

Com a mão direita foco-me outra vez.
Os olhos no espelho outra vez e por trás de mim só a luz de dois pontos que me perseguem. São mais benevolentes, estes pontos que me fixam do que os que sigo quando olho em mim.

Inspiro com toda a salubridade rítmica que Brahms deixou, esvazio o corpo e encho os pulmões.
Grito até que se rasguem em estilhaços os vidros que me vejam aqui, e cuspo saudades de sal, de me ver em ti noutros vidros que tais.

Embebedo-me numa calma de morte, amantizo-me dum último desvio final e alcoolizada em sombras, desligo.



Chove agora.
Chove muito.
Por dentro, por fora.

Lembro-me de dois pontos luminosos atrás de mim, que eu quis que me apanhassem e se apagassem depois. E lembro-me dum espelho.
E do que ficou nele escrito sobre mim.

Eles que te contem que me viram.
E que cantei o último silêncio.

Que chorei por ti.



05.12.05
*Mó

domingo, dezembro 11, 2005

é de amantes que se fala. e é dos que fazem silêncio que se faz mito.

"Durante todo o primeiro acto, Orfeu queixou-se com facilidade, algumas mulheres de túnica comentaram com graça o seu infortúnio e cantou-se o amor em pequenas árias.
A sala reagiu com um entusiasmo discreto.
Acaso se não notou que Orfeu introduzia na sua ária do segundo acto tremuras que lá não figuravam e pedia, com um ligeiro excesso de patético, ao senhor dos Infernos que se deixasse comover pelos seus prantos.
Certos gestos ritmados que lhe escaparam apareceram aos mais conhecedores como um efeito de estilização que aumentava ainda mais o valor da interpretação do cantor.

Foi necessário o dueto de Orfeu e Eurídice, no terceiro acto (era o momento em que Eurídice fugia ao seu amante), para que uma certa surpresa corresse pela sala. E, como se o cantor tivesse apenas esperado este movimento do público ou, mais certamente ainda, como se o rumor vindo da plateia tivesse confirmado o que ele sentia, foi esse o momento que ele escolheu para avançar para a boca da cena de uma maneira grotesca, braços e pernas afastados no seu trajo à antiga, para vir abater-se no meio dos redis do cenário, que nunca tinham deixado de ser anacrónicos, mas que, aos olhos dos espectadores, o foram pela primeira vez e de uma maneira terrível, pois ao mesmo tempo a orquestra calou-se, as pessoas da plateia levantaram-se e começaram lentamente a evacuar a sala, primeiro em silêncio, como se sai de uma igreja depois de acabada a missa ou de uma câmara mortuária depois de uma visita, as mulheres segurando as saias e saindo de cabeça baixa, os homens guiando as suas companheiras pelo cotovelo.
Pouco a pouco, porém, o movimento precipitou-se, o murmúrio tornou-se exclamação e a multidão afluiu às saídas comprimindo-se, para acabar por se empurrar e gritar.(...)"

Albert Camus - A Peste

segunda-feira, novembro 21, 2005

Repete tudo.



Repete tudo.
Só mais uma vez

para que de vez te troque por mim.

Em súplica te ordeno
Que condenes o que te é eterno,
o mais tumultuoso contentamento.
em sonos de azul e de vento.

Ordeno-te o meu firmamento.

Transladei os tumultos.
Enterrei os vultos.

Túmulos ocultos
Que eu ocultei.

Repete as sílabas adocicadas
Com letras envenenadas
Para que sucumba outra vez.

Repete a porta de entrada
E a fuga por validar.
Que por repetir a tua invalidez
Validei a vontade pouco acertada
De errar.



21. 11. 05
*Mó

sábado, novembro 12, 2005

Pego nas penas e junto-as uma por uma, pela ordem certa.
Faço um conjunto equilibrado, de peças conexas pelo desenho que achei mais delicado.

Calculo qual a pena mais pequena, qual a mais eterna, qual a que um dia, por esquecimento, deixei no bolso do casaco. Defino a hierarquia de todas, de cada uma em solidão e do espaço entre elas que tenho de deixar para que todas respirem melhor.

Algumas são coloridas, outras foram perdendo o contraste, foram ganhando camaleónicas adaptações à condição de passado. Todas já foram uma só, e quando todas as penas são uma só deixam de ser penas e são uma pluma de eternizações.
Foi bonito vê-las no fim, organizadas, da mais pequena à maior, da mais escura à mais iluminada, por ordem de importância, por desordem de pertinência – todas as penas são pertinentes, e uma de cada vez é-o mais ainda.

Colei-as com cuspe, daquele mesmo cuspe salgado que as vezes, quando não sabia onde tinha escondido uma pena ou outra, eu tinha nos olhos.
Esperei que secassem, que mirrassem devagarinho para eu pintar com cores os bocadinhos que iam ficando em branco entre uma e outra.
Foi demorado o processo, tive de encontrar uma por uma, tirar o pó, abraçar todas duma vez, não deixar nenhuma escapar no vento e contá-las com cuidado. As que estavam partidas foram as mais difíceis, porque penas partidas não têm arranjo, são como os caramelos que depois de derretidos não voltam mais. Essas, tive de tentar mais do que quaisquer outras encontrar o lugar onde se partiram, tentar entender quem estava com elas e quantas lágrimas as curaram.

Tive de chorar essas lágrimas todas e esperar que o sol as secasse do sal.

Depois também haviam algumas que eram teimosas. Diziam que não eram penas minhas, que eram virtudes de enganos que fui fazendo por aí. Diziam que não seriam condenadas a um quadro completo quando não viam em nada motivo de condenação.
Penas revolucionárias, chamei-lhes eu.
Prendi-as nas minhas pestanas e fi-las chocar nas pálpebras até elas entenderem o que eu queria que elas vissem no que eu via longe.

Quando achei que estava um conjunto equilibrado, pus um parafuso bem resistente pregado em algodão doce.
Pendurei o quadro e soprei com força.

Era o quadro mais bonito do mundo todo naquele momento. Mas também era o mais agarrado ao chão.

Soprei com mais força ainda.

Mas penas passadas não voam organizadas, pintadas nos buraquinhos em branco, presas à nuvem mais doce.
Penas passadas não se colam com lágrimas, não se rendem aos ventos.

Pousam no chão, ganham pó. Algumas teimam sempre, mesmo esmagadas entre as pálpebras, que não são penas de paz. Lutam contra a volatilidade e dizem-se penas pesadas de coisas que não são condenações.

Mas não voam.
Nem se enterram.




Antes de dormir, passo sempre um último segundo a secar uma lágrima. É sempre só mais uma, e é sempre demorado o processo do instante em que ela vai embora.

Antes de dormir olho o chão e olho o céu. Depois passo sempre um último segundo a secar uma lágrima. E é sempre a última.

Antes de dormir…seco as penas e voo. Seco a última lágrima no último segundo: enterro as penas pesadas, pinto os bocadinhos em branco debaixo dos pés e deixo tudo ganhar pó.

Antes de dormir sopro a nuvem, com o sal seco nos olhos e voo. (Sem penas a mais para me prenderem ao chão).



09.11.05
*Mó

terça-feira, novembro 01, 2005

[Desta vez.]

Vou-te ser muito sincera, desta vez.

Já não nos falamos faz tempo, e o que aqui disser não vai ser mais uma vontade de contar a nossa história à minha maneira.
É vincada a certeza de que não te tenho, mais vincada é agora a coerência de que sou o que nunca terei – porque, como tu, não sou de ninguém, e esse ninguém inclui-me na primeira pessoa.

Vou-te dizer que foi importante a primeira vez que te vi, e que não me lembro bem, que foi importante não ter notado nessa altura que estavas numa encubação silenciosa antes de me sanguessugares as coisas de encantar.

Foi importante seres uma surpresa, que eu só soube quando me disseste que te encontrei.

Foi, a certa altura, vantajoso saber que existias, mas só até cercares a minha paz com a tua presença anunciada - que eu anunciei.

Foi bom ouvir-te cantarolar velhas insígnias dum enamoramento que se sabe através de tantos outros séculos de amores que tenho lido por aí.

Foi o aceitar as tuas eternidades como minhas veleidades que fez com que desencarnasse das etéreas vontades que me afrontam de vez em quando – foi bom querer ser a tua rotina quando a minha rotina era a chaga que me electrocutava os sonhos.

Foste, enquanto foste aqui comigo, uma inspiração quieta, serena, de quem há muito queria respirar noutro corpo.

Não mais que isso.

Era bonita a música que baptizamos, especial a lua que alugamos, infinita a história que contamos um ao outro, nas noites de Inverno tardio, quando me vinhas buscar a casa.

Era linda, muito linda
, a simplicidade das personagens, a menina dos envelopes, o teu ombro com o teu violino, a hipnose quase ridícula que ele provocava em mim quando tinhas as mãos a fazer sons e os olhos fechados a ouvi-los.

Era perfeito o ridículo daquele fascínio, quando “ridículos são os que nunca escreveram cartas de amor”, mais ridículos serão os que não lêem o amor que lhes escrevem.

E foi delicioso ver-te nos instantes em que me lias.

Mas nada é tão importante assim.

Procurei-te tantas vezes em mim, para ver se tinhas sobrado no que eu criei.
Plantei-te na alma, com os pedacinhos que não conseguiste levar.
Tentei falar contigo, telefonei-te para te perguntar pelo tempo, por músicas emprestadas, outras devolvidas.
Sufoquei qualquer hipótese de não parecer que te precisava sereno, como a inspiração que me adaptou, a que me adaptei.

Passam-se as águas por baixo dos pés, os ventos por entre os braços e continuo estática, a borbulhar paixões de mim para mim, sobre criaturas extraordinárias que sabem transformar as coisas simples em simples coisas de sonhar.

Mas vou-te ser sincera – nada é tão importante assim.

Não foste capaz de me desembrulhar da pele de linho, mas fizeste da minha pele de carne a mais dolorosa. Para viver sem o conforto de fazer minha a tua sorte tive de fazer figas com os meus dedos e avançar para dentro de mim.

Cheguei perto de me amar.
Muito perto.


E fugi a tempo. Porque amar o que não se terá nunca é lição do passado onde te arquivei.
Porque nada é tão importante assim…porque descobri de uma vez que nunca amei a tua força, nunca invejei a tua garra – saboreei a tua glória porque ela me pareceu bem mais simples que a minha luta.

Porque foste o que pudeste, porque és o que quiseres sem atropelos de maior.

Porque te ofereceram as sortes todas e tu brilhaste maravilhoso, enquanto eu fiquei maravilhada.

Porque tens o requinte de decidir o que faz de ti mais especial, não porque tenhas de gritar como eu grito por tudo o que decido que me faz mais real.

Porque eu sou guerreira e tu és vitorioso, não porque tenhas sido alguma vez mais merecedor do que eu.

E vou-te ser sincera, na batalha dos amantes não houve mortes anunciadas, só a perda duma aliança que seria perfeita – perdeste tu, já que eu parti nesse duelo sem previsões dum final.


31.10.05
*Mó

segunda-feira, outubro 24, 2005

és tu quem não tem estado cá

"...o amor tem estado sempre perto, és tu quem não tem estado cá."

Á tua procura - SUPERNADA



Não tenho tido tempo para inventar coisas.
Não tenho tido paciência nem vontade para inventar coisas.

Ando entretida a brincar ás pessoas crescidas, como se as coisas que não inventei fossem um jogo daqueles em que se tem de passar muitos níveis para depois encontrar o monstro grande, ganhar e ficar com os castelos e os reinos todos do infinito.
Ou com um asteróide, como o menino daquele livro que não me canso de ler enquanto durmo.

As palavras enfeitadas atrapalham os espaços em branco entre as letras.
E eu não tenho tido tempo para barrocas e inóquas poesias. A vida é enfeitada demais para aceitar desenhos bonitinhos.

Só quero poder dormir outra vez com a chuva lá fora, e amanhã acordar com o sol cá dentro, espelhado nos lençóis, bordado nas minhas imperfeições de cansaço.

24.10.05
*Mó

(um beijinho ao menino da foto, e desculpa não te ter pedido para a tornar pública...)

quarta-feira, outubro 12, 2005

E é sempre só porque se sabe que não se fazem rascunhos do coração.
Tenho um corpo cheio de sonhos por dentro.
...mais um céu
...mais um mar
e mais tudo o que eu tiver.



Hope there's someone who'll take care of me
When I die
Will I go?

Hope there's someone who'll set my heart free
Nice to hold
When I'm tired

There's a ghost on the horizon
When I go to bed
How can I fall asleep at night
How will I rest my head

Oh I'm scared of the middle place
Between light and nowhere
I don't want to be the one
Left in there
Left in there


Hope There's Someone

Antony and the Johnsons

foto: Nuno Ferro ("the shell")

sábado, outubro 08, 2005


Eu sei que não lês o que escrevo.
Que nunca te preocupa saber se canto coisas para que caias desarmado no meu colo.

Mas caramba!
Custa assim tanto adivinhar-me à tua procura por todo o lado?

Parei à beira mar. Sem ti, por cá, vou andando, tem sido impossível voar sozinha.

*Mó

sábado, outubro 01, 2005

Pedi a todos que se encostassem à parede.
Revistei-os um a um.

A minha história mais pequena dava um conto policial, com a subtileza de Allan Poe, com a poesia de Baudelaire. A minha história mais pequena dava uma flor do mal, um ensaio sobre uma cegueira que eu achei emocionante inventar.

Não usavam casacos nem sapatos, quase os confundia:
Na mão de um encontrei o meu anel, nos olhos de outro a minha voz, nos lábios dela encontrei um segredo meu, nos lábios dele uma mentira qualquer que eu pedi que ela contasse.
Na sombra do quinto (a contar da esquerda para a direita), vi escondida a minha ingenuidade, entre os cabelos de outro, vi os meus dedos.

Perguntei-te o que achavas, se o crime era tão infundado assim, se era imperdoável tamanha insensatez. Perguntei-te qual seria a condenação.

E tu tapaste-me os olhos para que eu não soubesse mais de mim em partes. Mas eu ouvi na tua voz a condenação que merecias. Roubaste-me o coração, e fizeste-te juíz de tudo o que um dia eu possa querer emprestar a alguém que não tu.

(de tanto bater o meu coração parou)...



A minha história mais pequena dava o mais pequeno conto policial. Dava o canto duma gaivota em maresia incontrolável...uma página dum diário eterno:

"Piés para que te quiero si tengo asas para volar?" - Frida Kahlo

*Mó
01.10.05

sábado, setembro 24, 2005

a trama dos deuses

Não sei quantas vezes já te disse isto.

Dou por mim a duvidar se as palavras querem realmente dizer seja o que for, porque por mais que te fale não me ouves.

Acabei de saber de ti. Encontraram-te vagabundo a deambular pela noite sem mim. Trazias nos olhos uma sede que não me souberam explicar, trazias contigo uma data doutras almas que também vagueiam não se sabe bem porquê, e trazias as mãos vazias, os lábios fechados.

Caímos na mesma trama dos deuses, sei-o bem.
Achava que um dia eu seria capaz de me convencer que vivo bem sem o teu cheiro, começava a ponderar a tua pele na minha pele, já conseguia distinguir os meus braços dos teus abraços.
Mas nunca, nunca supus sequer que te esqueceria.

Já respirava sem ti, meu amor … andava a aprender a dançar com os meus pés e a cair o corpo no chão que eu escolhesse.
Já só chorava por ti uma ou duas vezes por segundo do tempo que um dia decidimos parar. Já cantava desafinada, já sabia rir dos meus atropelos, dos meus atabalhoados ensaios de valsas infinitas.

Já sabia dormir sem confundir o sonho com a insónia. Sonhava contigo em paz, amava-te em paz, longe de ti já sabia que não te tinha, mesmo sabendo que sempre foste meu.



Mas atirámo-nos na trama dos deuses, outra vez.
Enforquei todas as minhas pequenas vitórias de solidão numa teia enfeitada pelos teus suspiros.
Tive-te nos braços outra vez, senti-te a respirar nos meus ouvidos, as tuas mãos espalhadas pelos meus medos.
Apagas-te as memórias quase tornadas passadas, fizeste dos meus triunfos uma nova derrota – tive-te nos braços outra vez, a primeira vez em que senti que podia ser a última.

Não sei quantas vezes já te disse que te amo.
Não sei quantas vezes falei contigo com arrepios, com meias frases aguçadas, meios corpos aprisionados.

No meio do mundo, esqueci-te lá atrás e vi-te olhos nos olhos outra vez. Continuas perfeito, incompleto, enfeitado por um deserto onde não me deixaste entrar. Continuas a saber onde moram os meus sussurros, onde se põe o sol e nasce a lua – onde eu sou da parte do céu que é tua.

Não sei se te matei ali, no meio duma estrada perdida perto de mim.
Não sei se me matei ali, quando acabei com a minha voz sozinha.

Acabei por voltar a casa. Abri a porta, deixei-a fechar. Pelo quarto ainda encontro sinais de ti – encontro a música que me ofereceste e ponho a tocar.

Não sei quantas vezes já te disse, ou se alguma vez falei de mais –
hoje, meu amor, vou abraçar-me mais do que nunca, e adormecer agarrada ao cheiro do teu corpo nos meus beijos.

E hoje não volto a acordar –
antes ter-te cravado ao suicídio mais doce que ter-te perdido num passado que fiz por esquecer.

*Mó
18.09.05

sábado, setembro 17, 2005

Sopraram de longe.
E estávamos perto demais para não estarmos sozinhos...os dois.
É que, meu amor, "eras tu, em todas as praças, em todas as cidades".

Onde é que ficámos mesmo?



Still a little bit of your taste in my mouth
Still a little bit of you laced with my doubt
Still a little harder to say what's going on

Still a little bit of your ghost, your witness
Still a little bit of your face I haven't kissed
You step a little closer each day
That I can’t say what's going on

Stones taught me to fly
Love, taught me to lie
Life taught me to die
So it's not hard to fall
When you float like a cannonball

Still a little bit of your song in my ear
Still a little bit of your words I long to hear
You step a little closer to me
So close that I can't see what's going on

Stones taught me to fly
Love, taught me to lie
Life taught me to die
So it's not hard to fall
When you float like a cannon..
Stones taught me to fly
Love, taught me to cry
So come on courage
Teach me to be shy
'Cause it's not hard to fall
And I don't wanna scare her
It's not hard to fall
And I don't wanna lose
It's not hard to grow
When you know that you just don't know


(Damien Rice - cannonball)

quarta-feira, setembro 14, 2005

Muda de sítio.
Apanha boleia de alguém que passe por ti.
Quem não passe por aqui.

E muda de sítio.
Inverte.
Converte a troca na tua escolha.

Dobra a folha
e escreve no verso
um verso...
disperso.


Mas risca.
Arrisca.
Torçe a passada.
Apanha boleia errada.

Engana a morada
de livre arbítrio.

Troca de volta.
...Volta.

Mas muda de sítio.


14.09.05
*Mó



foto: Jan Falkenberg

sexta-feira, setembro 02, 2005

Metáforas de tudo o que são.

Sempre quis ter uma roseira. Daquelas que dão rosas todas as primaveras em flor.
Não queria saber de plantas em vasos, de ramos com arranjos e bilhetes de amor.

Só queria uma roseira.

Cheguei a escrever num diário que sonhava com o dia em que chegavas e me oferecias uma semente pequenina que eu plantava no cantinho mais bonito do jardim. Deixei o diário aberto, na esperança que lesses.

Sempre quis poder escolher a rosa mais bonita e penteá-la de manhã. Depois, escolher a rosa mais pequena e beijá-la antes de dormir, pedir-lhe que crescesse um dia.
Quis oferecer-te um espinho e uma pétala dentro dum envelope sem remetente.

Só com a tua voz no destinatário.

Queria uma roseira num cantinho do jardim. Sozinha, vaidosa, encantadora.
Só queria que fosse minha.


Um dia recebi um envelope.
Sem destinatário, com o teu nome no remetente.

"É a semente duma flor. E um beijo."
Plantei no cantinho do jardim.

Nunca nasceu.
Como esse beijo que nunca chegou.


Mas eu nunca quis um beijo.
Só quis uma roseira. Sozinha, vaidosa, encantadora... que fosse só minha.

Sempre quis ter uma roseira. Daquelas que dão rosas todas as primaveras em flor.
Disseram-me que os sonhos são botões de flor com um perfume que não morre. Botões de rosas.
Por isso é que eu
nunca quis um beijo.
Só quis uma roseira. Sozinha, vaidosa, encantadora...


01.09.05
*Mó

(foto de Joyce Tenesson)

terça-feira, agosto 30, 2005

Podia ser só mais um segundo.
Só mais um dia.
Podia o sol esconder-se só mais uma vez.

Acordar-me do céu só mais uma vez.

Acordo cansada com a vida por abrir num cofre de tempos.
Vivo num templo de cofres com vidas guardadas.

Podia ser só mais um beijo.
Só mais um recado por entregar.
Uma carta por escrever.

Podia ser só mais uma música. Mais uma dança.

Se não fosse a última.





Em flor te aguardo
Neste suspenso momento
Como se o vento
Fosse todo o meu resguardo
E assim me entendo
Ser desta fragilidade
Outra metade
De tão frágil fingimento
Que é seu talento
De entre as pedras ser aquela
Que nos revela
Em cada pedra um sentimento
Porém, se a flor
Tem no destino ser do vento
Há tanto tempo
E eu aguardo, meu amor


Ser Do Vento - Jorge Palma

sexta-feira, agosto 19, 2005

um dia, esqueço-me que vens.

Enquanto ele esvoaçava as velas erguidas mar adentro, ela tinha nos olhos uma maresia que decidiu amar.

Amarravam-se nos portos e esqueciam as promessas eternas.
Ele desabotoava-lhe os botões da camisa de linho e deixava que o vento lhe descobrisse o que a saia adivinhava.
Ela cheirava-o e aspirava-lhe o corpo com as mãos. Beliscava-o, agarrava-lhe a nuca e mordia-lhe o pescoço. Adorava vê-lo fraquejar, na corda bamba entre a loucura e a saudade. Esqueciam as promessas eternas e deixavam-se cúmplices dum sol quase posto, de dois corpos quase sós.

Separaram-se.
Num lugar de ninguém onde não há tempo nem luar.

Ela ficava à espreita, atrás dos mastros, enquanto tecia tramas das vazias promessas eternas que não conseguia esquecer.
-"É melhor assim." - deixou-a. Partiu.

Disseram-lhe que não mais o viram em paragem noutros portos. Ele disse-lhe que não fraquejaria nunca mais, que era do vento e do momento que viesse a seguir.

Disse-lhe que era dela mais do que queria, mais do que aquilo que podia querer dela. Era do vento, não podia ser de ninguém.

Nunca quis que ela lhe contasse histórias reais , de lugares reais - habituou-se a viver no céu que ela pintou só para o receber.

Nunca mais se tocaram.
A camisa desabotoada é parte duma promessa que ela não quer mais esuqecer.
Ele sugou-lhe pelos lábios o sorriso. E partiu...

Quando ela acorda, ou quando não se deixa adormecer, lavra lágrimas entre as águas traiçoeiras.

Vê-o de longe, ás vezes - com o mastro ao alto, num leme que ela escolheu.
Acena-lhe e esvoaça a saia - deixa-se cair.

Ele fica à deriva.
Não retorna a bom porto.
...não volta.

Todos os dias ela ouve o mar traiçoeiro inventar mentiras sobre uma lágrima que diz tê-lo visto chorar.
Todos os dias lhe contam que não mais o viram voar entre as redes duma teia de promessas eternas que não se quiseram cumprir.

Todos os dias ela tenta acreditar que são mentiras as verdades que ouve. Tenta achar eterna a última promessa de todas -

-"Não voltarei..."

Todos os dias tenta não morrer mais.
Não amar mais.

Ela sabe que ele é filho do vento - ela é amante do mar. Ela sabe que as velas erguidas vão sempre trazê-lo de volta...por mais que não a olhe, é ela que vê.

Ela sabe que um dia, no mais belo sol posto, ele vai chegar.
Com os olhos embebidos em saudade, vão voltar a quebrar as promessas eternas que os deixaram tão longe.



(Deixa-te embalar. Adormeçe de vez no colo dum anjo que saiba onde te escondes!
O teu lugar é aqui, onde te espera a sereia com a saia esvoaçada, no mar que chora por ti todas as manhãs.

Não te vais encontrar nesses lugares onde esperas que te procurem - a ausência do que te quer fazer eterno é a condenação à contra-maré.)

Um dia, cansado, tu retornas.
Um dia, cansada, esqueço-me que vens.


*Mó
19.08.05

"Is this the place we used to love?
Is this the place that I've been dreaming of?

Oh, simple thing, where have you gone?
I'm getting old and I need something to rely on.
So tell me when you're gonna let me in,
I'm getting tired and I need somewhere to begin.

So if you have a minute why don't we go,
Talk about it somewhere only we know?
This could be the end of everything.
So why don't we go somewhere only we know,
Somewhere only we know."

(Keane - somewhere only we know)

segunda-feira, agosto 08, 2005

Dança, ciganinha...

Ela andava sobre os estilhaços como quem penteia as cores do vento.

Ele não a descobriu nunca.
Achava sempre que as saudações de luz eram peças de poetas.

Achava-se poeta, ele.
Inspirava a mão no que dizia sentir.

Ela escrevia na areia. O riacho doce limpava-lhe os olhos quando ela sorria.
Espelhava o céu nos gestos.
Expirava alma no que cantava.

E não cantava palavras.


Ele fugia das fagulhas dos sentidos - não chorava demais, não comia demais, não dormia demais.

Ela dançava ao acordar.
E dançava enquanto dormia.
Tinha sempre os pés descalços e as mãos suadas dum perfume mascavado da cor do açúcar do sol.

A pele escamada era salgada de poeiras. Os cabelos negros torciam-se enrolados nos braços enquanto ela brincava ás escondidas com o mundo todo.


Ele dizia que os beijos se glorificavam - ela roubava com os lábios os cânticos das gaivotas.

Olhava-o.
Chamava-o
e ele escrevia sobre os olhos pérola-negros. Escrevia sobra as mãos queimadas, sobre os cabelos ondulados.

Sorria-lhe.
Escondia-se e voltava e ele tremia os dedos e continuava a escrever.

Fez-lhe um castelo de sonetos, uma ode inventada com riscos e desenhos.

Ela continuava a brincar com as curvas do tempo, as voltas dos gestos torcidos num corpo de sereia.

Um dia, enquanto ela cantava as palavras sem letras que ele não sabia decifrar, caiu das nuvens o dilúvio eterno.
As folhas pintadas de chuva derreteram e as palavras escorregaram pelo riacho doce.


Ele chorou muito.Chorou demais.
Ela puxou-o, sem o chamar. Enrolou os cabelos nas mãos trémulas dele, susteve-lhe o rosto e limpou-lhe as lágrimas com os lábios molhados.
Não lhe sorriu, não lhe cantou.

Ele fechou os olhos e viu tudo o que ela lhe gritava com o corpo.
Deixou que a voz lhe saísse sem pensar no que as palavras queriam dizer.

-Dança, ciganinha, dança...




Encontraram-no a sucumbir no meio da tempestade. Não havia ninguém por perto, ele tinha desparecido sem deixar sinais.
Disse qualquer coisa que as palavras não decifram, sorriu e não mais acordou.
Tinha os pés descalços. As mãos unidas por um fio de cabelo negro.

*Mó
08.08.05


De que tela surgiste, ave, sereia e flama,
toda feita de luz e carne? Os teus olhares,
nas olheiras de fogo, acendem a fagulha
do amor e da paixão, da febre e da saudade.


A cigana, Alexandrina Scurtu

quarta-feira, agosto 03, 2005

Saíram á rua.
Chamaram os responsáveis pelo horário do sol.

Era de noite fazia já 5 meses e ninguém havia contestado - lágrimas não renascem o dia.

Gritaram-me aos ouvidos.
Acordaram-me e afinal não havia ninguém.

Afinal não faltava ninguém.

Era só eu...com a janela cerrada.
(amanheceu...)

*Mó
03.08.05





Sérgio Godinho
Não vás contar que mudei a fechadura


Não vás contar que mudei a fechadura
Nem revelar que reclamei dos teus anéis
O amor dura, se durar, enquanto dura

E o vento voa à procura de papéis

O vento passa à procura dum engano
E quando encontra presa fácil na cidade
Bate à janela e redemoinha e causa dano
Naquilo que é suposto ser nossa vontade

Já de manhã vai parecer tudo tão diferente
Não é do vinho nem do sono ou do café
É só que um olho por olho, dente por dente
Nos deixa o rosto assemelhado ao que não é

E não vás contar-lhes desse abraço derradeiro
Nem que mudei a fechadura mal saíste
Quero o teu rosto devolvido por inteiro
O desse dia em que me vi no que tu viste

E não vás tomar à letra aquilo que te disse
Quando te disse que o amor é relativo
Se o relativo fosse coisa que se visse
Não era amor o por que morro e o por que vivo

segunda-feira, agosto 01, 2005

Dizem-me que há verdades que não se contam.
Digo que há mentiras que se decidem.

Não te digo nada.
Não te digo coisa alguma que oiças.
Perdi-me de ti no dia em que te vi de tão perto que perdi a imagem do que és - ganhei-me desencontrada num espço pequeno demais para mim e o meu prolongamento em ti.

Não me apetece dizer seja o que for.
Nem as verdades todas sobre as mentiras que te contei sempre.

Eu não acredito em fadas.
Nem em sininhos, nem em pós de ouro e céus e luas.
Não peço desejos ao nascer do sol nem me arrepio quando ele se põe.

As músicas que canto, são as que oiço e não as que choro. As que choro não conto a ninguém - nem a mim.

Muito menos a ti.
Que não soubeste nunca que se fiquei com a voz rasgada não foi de te chamar em vácuo - foi de tantas vezes ter-te perguntado o que fazias comigo quando eu estava sem ti.

Nunca estive doutra forma.

Eu não acredito em ti.
Nunca acreditei que fosses o cheiro que trazia comigo quando te levava para os sonhos todos.

Também não acreditei em mim.
Por isso não te contei que mentia quando me tinha encantada.
Por isso não me contei que te perdia quando me acorrentava.

Não acreditei que tivesses ficado longe.
Porque não aprendi a ver-te daqui.




Tocou a última valsa de olhos fechados.
Encravou a voz numa página de seda.

Tudo corre bem enquanto não acaba.


"(...)
Acabado de entrar, pensava como reconfortava a alma
nunca tão poucas palavras tiveram tanto significado
e de repente era assim, do nada, um ser iluminado -
e tudo fazia sentido,
respirar fazia sentido,
andar fazia sentido,
todo o pequeno pormenor em pensamento perdido
era isto que realmente importava,

não qualquer outro tipo de gratificação
(...)

A minha pedra filosofal
Seguia para dentro do nosso pequeno universo
Um pouco disperso - pronto, disponível a ser submerso
Naquele mar de temperatura amena que a minha pequena
abria para mim sempre tranquila e serena.

Tento ter a força para levar o que é meu
Sei que às vezes vai também um pouco de nós
Devo concordar que às vezes falta-nos a razão
Mas nego que há razões para nos sentirmos tão sós
Vem fazer de conta eu acredito em ti

Estar contigo é estar com o que julgas melhor
Nunca vamos ter o amor a rir para nós
Quando queremos nós ter um sorriso maior


Bem-vindo a casa dizia quando saia de dentro dela
O bonito paradoxo inventado por uma dama bela
Em dias que o tempo parou,
gravou, dançou,
não tou capaz de ir atrás, mas vou ,
porque sou trapalhão,
perdi a chave e já nem sei bem o caminho
nestes dias difusos em que ando sozinho
e definho
à procura de uma casa nova
do caixão até a cova
o percurso é duro em toda a linha,
sempre à prova.

Tento ter a força para levar o que é meu
Sei que às vezes vai também um pouco de nós

Devo concordar que às vezes falta-nos a razão

Mas nego que há razões para nos sentirmos tão sós
Vem fazer de conta eu acredito em ti
Estar contigo é estar com o que julgas melhor
Nunca vamos ter o amor a rir para nós
Quando queremos nós ter um sorriso maior
(...)

o calor é um alimento que eu preciso
o amor é apenas um constante aviso
se sabes que eu não vivo dessa forma
tu sabes que eu não sinto dessa forma"


Casa (vem fazer de conta)
- Da Weasel


01.08.05
*Mó

sexta-feira, julho 29, 2005

Inventei mais uma forma de não reinventar o mundo.
É mais um cantinho...são os meus olhares
...os mesmos, os de sempre, mas estes atrás (ou à frente) duma máquina qualquer.

sexta-feira, julho 22, 2005

Vi-te por lá. Onde os doidos fazem fitas e dizem que são heróis de banda-desenhada.
Rias muito, rias tanto que quando falavas gaguejavas. Na verdade, quando falavas não dizias nada - mas isso também era verdade quando te via por cá, no sítio onde os doidos brincam aos deuses.

Vinhas de braços abertos, peito apertado, e aquele gesto indefinido que agora decifro - fica mas não venhas.
Não me apertaste, não me levaste aos laguinhos e não contaste os nenúfares. Quiseste-me à espera, na margem dum rio de ouro, seco de sal dos choros que não saíram nunca de ti.
E eu fiquei.
Sentei-me agachada, acorrentada ao nevoeiro do brilho que desapareceu de ti. Idolatrei reflexos que não existiam, enfeitei-me sobre a água e esperei. Confessei a quem passava que o meu anjo era o meu amor, e esperei.
Ouvi que os anjos não vêm e não acreditei - disse sempre que era tolice não almejar um par de asas de verniz.
E esperei.
Cheguei a molhar as mãos.
Senti o rio frio, seco, doce. Pensei em correr à foz e ver onde acabava o curso dos sonhos, mas fiquei. Esperei.
Tu aparecias, de quando em vez, atrás do meu espelho - achava-te sempre à frente dos meus olhos. Esperei.

Vi-te por lá. Não sei quando, não sei como, não sei porquê. Era de noite e à noite a água salgada do rio quase doce fica negra. Vi-te por lá, no escuro quase cego dum naufrágio onde eu achei que sabia nadar. Vi-te na proa, com as velas erguidas, como os doidos que são heróis de banda desenhada.

Com os pés cansados, esperei.
Não desceste do pódio dos teus dias que eu um dia pintei com diamantes.
Vi-te alto demais. Fiquei pequena de tanto te pôr lá no alto.

Esperei demais - esperei sem saber quanto.
E tu não ficaste, nunca cá estiveste. Levaste-me solta para depois me atracares os pés molhados à outra margem do teu lugar.

Esperei muito. Vi demasiadas manhãs com demasiadas histórias. Adormeci demasiadas vezes durante os silêncios soturnos de noites vizinhas da tua escuridão.




Mas hoje o céu é turvo e a àgua cálida não turbilha muito. Leio-me entre as gotas de sal queimadas. No meu reflexo vejo a vela erguida da tua sonâmbula visita, e sei que não te vou achar mais à frente dos meus olhos.

As correntes esfarelaram-me os pés mas ainda consigo andar.
Lá, na terra dos doidos, sei que tenho à espera a escada que vai deixar os deuses descerem até mim.
Lá, não volto a rasgar os dias à espera - sonhar com o teu regresso é crucificar a tua partida.
Não espero mais, meu amor.


22.07.05
*Mó

sábado, julho 16, 2005





Tudo tem um segundo em que deixa de ser tudo.
Até sempre, que é tão perto do até nunca mais.




I walk a lonely road
The only one that I have ever known
Don't know where it goes
But it's home to me and I walk alone

I walk this empty street
On the Boulevard of Broken Dreams
Where the city sleeps
and I'm the only one and I walk alone

I walk alone
I walk alone


My shadow's the only one that walks beside me
My shallow heart's the only thing that's beating
Sometimes I wish someone out there will find me
'Til then I walk alone
I'm walking down the line
That divides me somewhere in my mind
On the border line
Of the edge and where I walk alone

Read between the lines
What's fucked up and everything's alright
Check my vital signs
To know I'm still alive and I walk alone

(Green Day - Boulevard of broken dreams)



...e os violinos todos do mundo fecharam as almas de quem os ouviu.
(xiu...não digam mais nada. as melhores músicas acabam assim.)

*Mó

domingo, julho 03, 2005

Não gosto nada de declarar despedidas.
Não me apetece nem um bocadinho dizer que sinto a vossa falta e ainda nem vos vi partir.

Não me apetece ver.

Não tenho vontade nenhuma de fazer com que a vossa ultima recordação minha seja com sal nos olhos.Nao quero sequer pensar que será essa a ultima imagem que gravam de mim por perto.
Não quero prometer que vai ser sempre como se nunca nos tivessemos separado, porque isso significaria que nunca tinhamos estado juntos.

Não quero saber da hora em que partem, prefiro ficar aqui quieta e escrever-vos.
Prefiro dizer-vos agora, que sei que estão quase a ler-me de longe, que é esta a minha forma de gritar que sinto tanto a vossa falta.
Que não consigo inventar as manhãs de chuva sem as vossas birrinhas de quem só sabe o que é acordar com sol...não consigo adivinhar como vão ser as filas de espera sem voces para contar piadas.
Porra, não quero fragilizar-me nas palavras e derreter a força toda que quero deixar de pé, mas...porra, voces fazem-me falta!

Não sei com quem vou chorar este ano novo quando estourar o fogo lá em cima, não sei com quem vou dançar pagode, com quem vou rir nas noites de churrascos e de queima em que voces eram sempre o meu lugar mais encantado.

Não sei mesmo.

Mas sei que vivemos coisas fantásticas, sei que sempre soube que um dia chegava o dia de voces voltarem, sempre soube que não vieram para ficar. E, talvez por isso, reservei os segundos todos para decorar os vossos jeitos, para memorizar ao detalhe as expressões dos vossos olhos quando sorriem.
Decorei os bocadinhos das vossas almas que consegui ler, e tatuei-as na minha.

Assim eu sabia-vos para sempre comigo - se não for em frente aos meus olhos, que seja dentro deles.

Adoro-vos. Sem cliché. Adoro tudo o que aprendi, tudo o que desaprendi para vos ouvir com mais atenção, como se fosse a primeira vez que ouvia o que voces me diziam.
Porque, afinal, não interessam as palavras, mas o sítio onde elas nascem...

Adoro-vos tanto...que chego a achar que sei que da próxima vez, quem volta sou eu - porque chego a achar que o meu lugar é onde vocês estão.

***Mó
3 de Julho .05


terça-feira, junho 21, 2005

recapitula o ensinamento:

Lê o contratempo.
Memoriza o que precisa
o teu discernimento.

Retorna.
Lê o capítulo dobrado.
Relê com cuidado.

E evacua
da folha o fonema.
Faz disso modo
ou estratagema.

Lê em acontecimento.
A parte do intento
dum dilema.

A parte em que o texto
é poema.

O inseguro grito
sem ar.
A parte da alma
de amar.



21.06.05
*Mó



sexta-feira, junho 17, 2005

Tocos de iras.
Trapalhadas.

Agarrei-te nos pés,
andei no teu passo.

Cem horas cansadas
sem dores de cansaço.

Partes de cenas,
actos de peças
de coisas pequenas.

Os lados do plano,
ou um canto da curva.

Um lago de patos
de água turva.

Agarrei-te nas sombras.

Pelos cantos.

Mordida de luz,
perdida de prantos.

Tocos de iras.
Rasgos de folhas
em tiras
de velhas
mentiras.

Partes de cenas
do fim.

Partes de perdas
de mim


17.06.05
*Mó

quinta-feira, junho 16, 2005

Desculpa
que me perdi
por aí.

Desculpa
que tropecei.

Desculpa
se me enganei.

Desculpa.
Não me encontrei.

Não encontrei
ninguém.

Desculpa,
não sei onde fica.

Desculpa
a quem não me explica.

Desculpa
as coisas pequenas.

os telefonemas.

Desculpa
a minha demora

Desculpa
não ter ido embora.





Desculpa
os encantamentos.

Desculpa
os momentos
de magia.

Desculpa
mais este dia.

Desculpa
as desculpas
para não dormir.

e desculpa-me por não partir.

Se me desculpares
as feridas
desculpa-me as balas perdidas.

Desculpa
ter-te acertado.

Desculpa tê-lo feito
no segundo errado.

Mas não aceites
nenhum pedido,
de quem se tenha perdido.

Se me perdi por aí
desculpa o meu pecado
mas foi propositado
o esquecimento

Desculpa,
mas não lamento.


16.06.05
*Mó

segunda-feira, junho 13, 2005

Palavra ou rima
ou metáfora em cima
da frase
ou quase...
ou tudo.

Ou quase tudo.

Quase mudo.

Quase anti-tese.
Sem tese.
Sem esquema.

Que é vã a alegoria
de ser dilema
noutro dia.

Ou na noite de marasmo,
ou no tema
dum espasmo
de poema.

Duma rima.
Escrita em cima
da metáfora
da frase.
Da quase asa
dum fonema.

Dum quase quase
medonho.

Quase poema.
Quase sonho.





26.05.05
*Mó

domingo, junho 05, 2005

o amor é para os parvos

Costumavas dizer:

-Quando penso em ti, vejo-te com a cabeça pousada nos meus joelhos, a olhar para mim com os olhos grandes. Ás vezes tens os olhos fechados e estás a dormir, mas o que interessa é que é assim que eu penso em ti: com a cabeça pousada nos meus joelhos, quieto, enquanto passo a mão, devagar, pela escova mole dos teus cabelos.

(...)


É sobretudo agora, que já aqui não estás, que gosto de imaginar-me tal qual tu então me vias
-Com a cabeça pousada nos meus joelhos, quieto, enquanto passo a mão, devagar, pela escova mole dos teus cabelos.

Mas não posso já aninhar-me no teu colo e a verdade é que mesmo tu, tenho a certeza, não me recordas já assim. Só se fosses parva e preferisses enganar-te, preserverando em não querer entender quem eu sou.

(...)
O amor é para os parvos, eu sei, e a vida sem motivos é para os pobres de espírito; para os que não têm coragem, nem força, nem ânimo para morrer. (...)Pareço um mau actor de um mau filme, eu sei. Um desses com poucos diálogos e quase nenhuma acção, em que as pessoas conversam com as cadeiras e com as paredes com palavras que já ninguém usa, com frases que ninguém diz. É um bom motivo para que não voltes, eu sei(...)

Mas somos dois corpos ainda. Dois corpos a que falta uma meia parte, a tua presença, ainda que as vezes, à noite, quando o ruído da cidade cessa e não se escuta mais do que este silêncio cheio de pequenos sons, eu possa pressentir os teus passos a caminhar pela sala, espiando-me enquanto escrevo, calado, sem nada dizer.
É então que me ergo e apago a luz e vou aninhar-me no sofá que está peto da janela. Poiso a cabeça e fico
-Quieto
como um gato, sentindo a impossibilidade dos teus dedos massajando, devagar, a escova mole dos meus cabelos.


(...)

Manuel Jorge Marmelo - "O Amor é Para os Parvos"

quinta-feira, junho 02, 2005

Em ti.

Na linha.
No vácuo
da minha carreira
não houve barreira.

No passo
batente.

No embaraço
do teu insistente
cansaço...

Na tua cegueira
de gente.

Na dobra do corpo.
Na vértebra
dobrada.
Uma cobra encantada.

Um louco.
Uma fada...

...tão pouco
...tão nada.



*Mó
01.06.05

terça-feira, maio 31, 2005

Risca na parte de trás do bilhete de cinema as directrizes para os teus sonhos.
Desenha em cima do talão dos carrinhos de choque as coisas que dizes que me fazem rir.

Escreve no ticket do combóio o caminho da tua porta.

Inventa no meu relógio os ponteiros das tuas horas e tira-lhe a bateria.



Prometo que faço um filme do teu sono.
Uma viagem nos teus lábios.

Prometo que não me perco.

E que não me atraso.



*Mó

sexta-feira, maio 27, 2005

Está cinzenta a sombra do sol.
Está quente o cheiro do ar.
Está quieto, lá em baixo, o rio de prata, sujo de ouro.

Está doente a ponte.
Estou descalça. Sem mangas nos braços. Sem o cabelo amarrado.

Sem fome. Com sono. Sem tempo para saber se estou sem corpo.
Sem lágrimas. Sem dramas.

Cem lutas depois e eu com todos os suspiros do mundo.

Contigo.
Comigo...
Comigo...


Mó*

terça-feira, maio 24, 2005

"maybe...U're gonna be the one"

Today was gonna be the day
But they'll never throw it back to you
By now you should've somehow
Realized what you're not to do
I don't believe that anybody
Feels the way I do
About you now

But all the roads that lead you there were winding
And all the lights that light the way are blinding
There are many things that I would like to say to you
But I don't know how
I don't know how

I said maybe
You're gonna be the one that saves me
And after all
You're my wonderwall

I said maybe (I said maybe)
You're gonna be the one that saves me


a k7 já empanca no rádio...mas as palavras saem direitinhas..."SAID MAYBEEEEE"
*Mó

sábado, maio 21, 2005

E porque não?
Engasgas-te e não deixas de beber.

Não deixas...
se deixas...voltas.

Não?

Porquê?

Porque não.


Steve Bingham . "altered decisions"

sábado, maio 14, 2005

Eu fico à baliza...

-Acorda! O teu pai foi buscar o almoço e volta já, veste-te e vai ajudar a tua irmã a por a mesa.
-Oh mãe...mas ainda é tão cedo!

(...)

Sempre que tenho de acordar peço que me acordem. Quando não quero pensar em mim num espectro de invulnerabilidade, deixo-me adormecer com os sons todos do rádio.

Não desperto. Não tenho vontade de o fazer.

A gravata já sabe fazer o nó na camisa e as casa dos botões já me endireitam os punhos antes de vestir o casaco.
O carro já sabe o caminho de volta.
Só o de volta, porque sabe sempre que não quero nunca voltar.

(...)
-Vá lá, deixa-te de coisas. Estamos lá em baixo à tua espera.
-'Tá bem, já vou...

(...)

Decidi que ia deixar tudo correr como quisesse. Decidi que não ia decidir mais nada.
Mas olhei nos olhos da tua mãe.
E ouvi a tua irmã a descer as escadas a correr, a espreitar atrás da cortina enquanto eu passava o portão de casa, ao fim da tarde de hoje.
Vi que a relva do jardim estava pantanosa e que a roseira tinha desmaiado.

(...)
-Mamã, vamos hoje a casa da avó?
-Não filho, a avó foi almoçar com a tia Luísa.
-E o papá, vai demorar?
-Não, ele vem já.

(...)

A tua janela fica mesmo por cima da porta. Escolhi esse quarto para ti porque sabia que gostavas de ver os carros a passar, não é? E, um dia, quando crescesses, era pela janela que ias espreitar a vizinha da frente, como eu as vezes fazia quando te ia deitar.
Entrei e a porta fechou-se atrás de mim. Porque eu não a fecho mais desde que decidi que não ia decidir voltar.

(...)

-Papá!Chegaste!
-Tem calma, filho, o teu pai não foje!

-Que tens nessa saca?Uma bola!
-Mas primeiro vamos almoçar, seu tolinho...

(...)

A tua janela está fechada.
Nem eu nem a tua mãe conseguimos arrumar os cromos que deixaste pelo chão do quarto.
A tua irmã diz que agora já sabe acordar sozinha, mas ainda só adormece quando eu a deito.
Agora já não espreito a vizinha da frente, filho. E tenho o carro parado à porta, mas não te vejo à espreita, por cima da porta.
Decidi que não ia mais voltar.
Desde que não te tenho a correr atrás da bola, depois do almoço, enquanto a tua mãe faz tranças à tua irmã.


(...)

-Ficas à baliza?
-Fico, mas não chutes com força!

(...)

Não volto mais. Fico à espera que voltes tu. Ou que me venhas buscar.

A tua mãe tem os cabelos da tua irmã para fazer tranças.
E eu tenho a tua bola nas mãos.

Eu fico à baliza.


13.05.05
*Mó

sexta-feira, maio 06, 2005




Podia dizer tanta coisa.
Que saí de casa a correr, que perdi o autocarro e fui a pé, que esperei à porta até poder entrar.
Que fiz uma ferida no pé de andar tanto, que me esqueci da ferida assim que entrei.

Que vi o concerto todo pelo caminho, ou por outra, que ouvi o concerto, não cheguei a ver.
Que não sabia que ia estar tanto vento.
Que recebi troco a mais, que me enganei e entornei vodka nas calças...que tive frio a noite toda.
A pele de galinha a noite toda...

Que me roubaram um beijo, que me pediram outro, que me levaram as cavalitas e não me deixaram cair.
Que não ouvi o telefone tocar.
Não ouvi nada. E podia dizer tanta coisa que me disseram, se eu tivesse ouvido.

Mas passei a porta com o pé ferido.
E mesmo com o pé ferido, entrei.

Não vi o concerto, entornei vodka nas calças e arrepiei-me com o vento.

Vi o dia começar, e sabia que ainda lá estarias quando eu saísse porta fora.
Só para que eu voltasse outra vez.

Até logo, até hoje.
...até sempre...

segunda-feira, maio 02, 2005


apanha o maior dos momentos e faz dele o corpo lapidado que te escorregou entre os dedos.

quinta-feira, abril 28, 2005

o que te inspira?

É a inocência que trago presa aos braços que me faz calos nas mãos.
É por ela, só por ela que escrevo.

Porque sou uma gaivota. Que foge das tempestades e que corre ao mar quando o dia é de sol.
Porque sou gente. Simples, afinal.
Que constrói camuflada a vontade de aspirar ao céu.


28.04.05
*Mó

terça-feira, abril 26, 2005

Vinha meio rasgado, mutilado, húmido e ressequido, entalado na ranhura metálica.
Vinha rabiscado, selado, carimbado pelos sitíos donde veio, e pelo sítio onde chegou antes de chegar até mim.

Vinha sozinho, esvoaçado, com ar de quem sabia que não era esperado.
Quem sabia que era a coisa mais desejada naquela manhã de céu nublado.

Vinha acastanhado. Papel reciclado, como se fosse um segredo embrulhado num enredo com um remetente e um destinatário colado.
Com o meu nome desenhado.

Vinha de ti.
Entalado na ranhura da caixa do correio que fica mesmo ao lado da porta de entrada do meu canto encantado.
Agora bem mais dactilografado.

Vinha desse lado da terra onde se cantam coisas que eu não sei ler, de onde me escrevem sonhos que cantei quando encontrei perdidos.
Húmidos.
Num envelope reciclado, sozinho na ranhura metálica da caixa que tenho ao lado da porta.

Vinha com o cheiro das mãos todas que o quiseram. Das vidas de quem não tinha o nome no destinatário.
Agora cheira à saudade.
Só agora, que te vê de longe é que cheira a ti, porque cheira a mim quando não te tenho e te sinto aqui ao lado.

Vinha de ti, com o teu ar despistado e baralhado de quem sabe ver o sol num dia como o de hoje...nublado.

Fazes-me falta, tolinho...volta depressa e puxa-me as orelhas quando chegares.
Ou canta-me todos os dias...agora que sei o que dizes já te oiço aí de longe.

(a quase-musa quase-idiosincráthica salamandra*)

*Mó

segunda-feira, abril 25, 2005




Ne me quitte pas
Je ne vais plus pleurer
Je ne vais plus parler
Je me cacherai là
A te regarder
Danser et sourire
Et à t'écouter
Chanter et puis rire
Laisse-moi devenir
L'ombre de ton ombre
L'ombre de ta main
L'ombre de ton chien
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas.

Jacques Brel

sábado, abril 23, 2005

Agarro-me ás paredes. Agarro-me ao corrimão das escadas e desço os degraus dois a dois.
Agarro as mãos ao volante, os olhos ao relógio que nunca esteve certo.

Como qualquer coisa, bebo um copo de água morna e saio de mim.
Mais uma vez, mais uma coisa qualquer por digerir.
Mas é só amanhã que penso nisso.

A saia pelo joelho e o casaco deixado para trás.




Começa a luz a descer, alinho as garrafas todas e separo os copos um a um. Pergunto se demora muito, se amanhece já daqui a um bocadinho ou se é paz que encontro quando procuro uma má refeição...para uma má digestão de amanhã.

Ele saiu dum buraco qualquer. Um dia encontrei-o por cá e perguntei-lhe o nome, hoje ele veio, mas não lhe perguntei onde vive. Não lhe disse o meu nome e ele perguntou-me pelas asas.

"A fadinha desceu à terra."


Disse-me que não sabia onde é que eu ia, que nunca soube donde vim. Nunca chegou lá.
Não voei.
Não quis.

"Vai embora. Não chego tão alto."

"Fico. Hoje posso ficar."

Não cheirava a ti. Não bebe o mesmo vinho que tu. Não sabia a ti nem me perguntou onde é que tu estavas.

"Adoro-te princesa."


Só lhe cravei um sussurro lento nos lábios. Não eram os teus lábios, nem eram as tuas mãos nas minhas costas. Nem o fumo dos teus cigarros de madeira polida.
Era vadio aquele lugar onde ele estava, donde me pedia para fugir e depois me puxava para ficar.
Eu fiquei.

"Desci do céu para o levar comigo."

Ensinou-me que se seguram na mão os copos que pousei na mesa. Expliquei-lhe que na mão eles caem.

"Eu não posso subir outra vez."

E agarrou-me com a força duns braços que não conseguem pedir para ficar nem sabem mais dizer adeus.

"Não foi por ti que desci. Por isso fico hoje."

Ele não sabia a ti.
Mas sabia à terra, ao lugar vadio donde saiu e onde faz pose para as fotografias das vidas de quem por ele passa.

Quem nunca fica.

Apertei o casaco, faz frio lá fora. Ele estava abraçado à porta, de olhos fechados, a um vazio qualquer.
E eu saí. Com a digestão bem feita e com os braços cansados, de alguém que não consegue dizer adeus.
A ti, meu amor, que és do céu que eu deixei para trás quando te vi descer.


23 .04.05
*Mó

quinta-feira, abril 21, 2005

Dizes que te escondes quando chegas a casa e desces as persianas do quarto.
A cidade está toda acordada e nenhuma janela se cerra como a tua, do lado de fora.

Acreditas mesmo que assim não te encontram?


(O corpo berra-me aos ouvidos. Tenho de ir, não vá ele calar-se e eu volte a ouvir a alma.)

quarta-feira, abril 13, 2005

Dormes todos os dias na minha cama.
Sentes a água que escorre na pele escamada pelo sol quando todas as manhãs tomo banho.
Bebes da minha chávena, adoras o mesmo chá que eu bebo.
Bebes da minha boca, ouves com os meus ouvidos e sabes que as palavras que te dizem são as mesmas que oiço contigo.
Adormeces quando fecho os olhos, acordas quando bocejo.
Lês os meus livros, ouves as minhas músicas, escreves com as minhas mãos as coisas que te digo quando estou sozinha.

Cais nos mesmos enganos, levantas-te e puxas-me ao mesmo tempo.
Corres enquanto eu não me canso, e cansas-te sempre que salto demais.
Não sabes voar. Nem eu.
Mas sabes que é facil ver o mundo de cabeça para baixo e sentir que tens os pés no céu.
Como eu.

Apareces nos meus retratos, tens o teu cheiro nas aguarelas que pinto, nas roupas que visto, nas que dispo. Tens o teu rosto no meu espelho, as unhas nos meus dedos, o sinal perto do umbigo, outro no meio do rosto.

Como eu.

E tens os olhos iguais aos olhos que eu imagino que têm os anjos.
Castanhos, grandes, com rugas nos cantinhos.
Tens os cabelos compridos, como sempre li que tinham as princesas.
Tens um jeito desengonçado de andar pela rua, tropeças com sapatos altos e ris-te muito quando te apaixonas.

Tens tudo o que eu sou.
E percebi que só contigo é que eu posso andar pelo mundo sempre com a certeza que és o meu porto seguro toda a vida. O meu caminho para todos os outros apeadeiros onde passar. Talveaz outros portos onde atraque.
Talvez outras mãos, outro rosto no meu espelho, outros olhos, de outro anjo.

Talvez tudo. Talvez para sempre.

(acordo de manhã e nunca durmo acompanhada. No espelho do meu quarto não vejo nada atrás de mim. Tomo banho sozinha, vivo com os olhos arregalados e os cabelos torcidos numa trança.
Agora, antes de dormir, sorrio para dentro. Apaixonei-me por mim.)



13.04.05
*Mó

domingo, abril 10, 2005



albufeira - abril 2005

num blog duma gaivota que foi sereia, este fotografia teria de ficar à parte.
Achei quase inacreditável quando vi o resultado, talvez tenha sido das melhores imagens que ja consegui resgistar...das que falam por si.
Sempre foi difícil acreditar nos encontros pouco repensados, sem datas marcadas, viagens programadas e regressos certos.
Mas acreditar em encontros pouco repensados que têm tudo a bater tão certo ainda é mais dificil.




Abro o "fakeiro" todo quando me lembro das coisas que foram só nossas...e eu não sabia que vocês existiam...




...agora já não sei como é que podem deixar de existir.




O acaso foi incrivel, mas impiedoso. Tinhamos mesmo data marcada, e dia para voltar...pra proxima atiramos mesmo os telefones pela janela e ficamos por aí...




afinal, acabei por não aprender a dar chutos na bola, nem "toladinhas" de jeito...




afinal, foi só o começo, "sócios..."**

se te amei foi porque te menti.




Se não houvessem motivos para olhar para trás e chorar não saberia o porque de querer olhar pra frente e não ter vontade de repetir tudo.
Continuar a tentar. Sou eu prostrada num lugar onde já não há restos de cinza. Onde tudo que aconteceu antes desta manhã já não tem como continuar a esvoaçar por aí...
Sei a verdade toda sobre tudo o que me interessa acreditar, sei as mentiras todas das falsidades que inventei para que as coisas em que me interessa crer sejam todos os segundos mais reais.
Não há restos de cinza. Só corpos acabados, com significados inventados.

Se te disse algum dia que a minha fraqueza existia nos joelhos, era porque queria que mos tocasses, nunca porque os sentia a desfalecer. Se algum acaso fez com que escorregasse numa piedade qualquer duma verdade que fingi esconder não foi porque não to quisesse contar, mas quis que pensasses que também eu sei como errar. Nunca que achasses que erro sem o saber.
Se nunca te disse que te queria era porque não queria mesmo. Mas se não fiquei calada, era porque queria que me quisesses a querer-te. Queria que fizesses qualquer coisa para eu alienar as palpitações todas, desacerta-las e entrega-las a ti, ter vontade de te mentir e dizer-te que era tua.

Se te rasguei os lábios, se te mordi o cérebro, foi só porque queria ter-te metamorfoseado com uma estaca no coração.

Se te chamei ontem, ou noutro ontem qualquer, não foi para que viesses.
Foi para te dizer que não voltasses, para que não mais soubesse que um dia voltaria a ver-te partir.

Se te amei foi porque te menti.
Se não houvessem motivos para olhar para trás e chorar não saberia o porque de olhar pra frente e não ter vontade de repetir tudo.

Se te amei foi porque te menti, foi porque te amo hoje.


03.04.05
*Mó

quarta-feira, março 30, 2005

principezinho.(tu?)

Cresci a olhar para os espelhos dos olhos dos outros.
Diziam-me que não me viam quando lhes perguntava onde é que eu cabia.
Diziam-me tão pouco além disso.

Fechava-me no meu quarto, com a porta entre-aberta - uma frincha com espaço para dois dedos da mão direita da minha mãe, e sentava-me no chão a fazer de conta que as bonecas todas tinham vozes e que ás vezes até deixavam de ser as minhas melhores amigas, para no dia seguinte fazermos as pazes e eu ter mais um bom motivo para voltar ao meu nicho no meio do chão.

Tinha a alcatifa empoeirada, e adormecia muitas vezes entre uma historia e outra. Deixava as personagens fazerem as escolhas delas, mesmo quando não cambaleava com as pestanas pesadas, fazia de conta que adormecia.
Depois, quando acordava, achava sempre que tinha deixado tudo noutra posição, que eles todos tinham vivido durante a minha ausência silenciosa.

Mesmo quando me fechava no quarto, fugia dali.

Nunca troquei uma boneca, um berlinde, e até os autocolantes das cadernetas me faziam tremelicar uma lágrima quando despareciam.

Nunca ganhei aqueles concursos que faziam as minhas colegas- não fui a menina mais gira, nem a mais simpática, nem aquela que tem o carro mais bonito, o cabelo mais macio.

Nunca tive os olhos azuis, nem as mãos quentes.

Não sei jogar futebol, não conseguia trepar as arvores e quando saltava à corda, tropeçava.

Não trocavam bonecas comigo.
Nem berlindes.
E eu dizia que não queria, que não precisava.

Chamaste-me pelo nome que inventaste para mim. Inventaste que eu inventava os nomes das coisas. Eu só te disse que te inventei a ti.

Só a ti. Como às bonecas que eu nunca troquei.

(colei um espelho gigante na porta do quarto. já não a deixo entreaberta.)




Don't stop moving, you must keep on going
don't you stop believing, you should go on dreaming
Don't stop moving, you must keep on going
don't you stop believing,
'cause its people like you that make the world go...
(...)
If you ever need me, just remember
and i'll always be there
If you ever miss me, don't you know
...don't you know...
...we will meet again
...we will meet again


(Coldfinger - cover sleeve)


30.03.05
*Mó

sábado, março 26, 2005

esperas...




9 meses para nascer... Começa tudo assim, é igual para todos. Vou acreditar nisso e não me vou por aqui com questões de índole científica e/ou ético-filosóficas. O fenótipo começa aí, durante 9 meses de delineação do genótipo, e depois sai a conta direitinha - tu. Esperam que não te ponhas com manias, que chores assim que estiveres cá fora, afinal, já estiveste tempo de mais calado, dizem eles.
Fazes as coisas bem feitinhas mas, não contentes, perguntam se vais demorar muito a abrir os olhos. Caramba! Acabaste de gritar e estás cansadíssima! Mas não querem saber...
Depois vem o primeiro xixi que nunca mais chega, o primeiro soluço, o primeiro arroto, o espirro, o bocejo, o fechar da mão, o mexer do pé, o tossir, soluçar, dar pontapé, puxar os cabelos...esperam cada reacção, ou por outra, cada acção, porque tu estás realmente nas tintas para saber se te pedem para sorrir, tens uma vida inteira para o fazer.
Passa, tudo passa.

Remelas nos olhos todas as manhãs, aquelas cócegas no nariz, os espirros na primavera, os arrepios no inverno...um...outro, passam todos. Esperas acordar, esperas que o despertador toque segunda vez, porque só depois disso é que te levantas, fazes sempre as coisas por faseamento...duas esperas pequenas rendem mais o tempo, senão deixavas que ele tocasse sempre na hora em que toca pela segunda vez...todos os dias.
Esperas que a água saia quente do chuveiro, e despes-te. Esperas que acabe a água quente, e sais. Vestes-te. Esperas que as torradas fiquem prontas, que o leite fique quente. Esperas acabar de comer para lavar os dentes, já com água fria. Esperas acabar de te vestir, pões as lentes de contacto, e só depois é que te olhas ao espelho.
Esperas não ter uma má surpresa quando o fizeres.

Esperas
que pare de chover, não podes molhar as botas novas, esperaste pelo natal para as comprares. Sais com toda a pressa, como se estivesses pronta há imenso tempo, e vais até á paragem. Esperas o autocarro. Chega. Olhas e não é o que te leva onde queres ir. Esperas o próximo, e o outro. Volta a chover, molhas as botas.

Chega. Esperas ter um lugar para te sentares, mas sabes que sempre que vais atrasada acabas por ficar entalada na porta. O motorista abre a porta, vais á carteira e não tens senha. Deixaste-a em cima da mesa ontem, no meio das tuas coisas, enquanto esperavas que o chá arrefecesse, antes de ires dormir.
Tiras o dinheiro, esperas ter que chegue, senão sabes que tens de sair e fazer o caminho todo para trás, esperar mais meia hora pelo proximo autocarro.
Não arranjas lugar, já era de prever.
Primeiro sinal vermelho, segundo. Esperas.
Um acidente ao fundo da rua, e mais um compasso em paragem.

Pensas em tudo o que vais fazer hoje. As vezes que vais dizer "bom dia", os sorrisos que vais receber em troca, as desilusões que já não te surpreendem. Pensas em tudo o que esperas poder esperar. Fazes contas de cabeça, quantas vezes vais esperar qualquer coisa até o dia acabar.

E só esperas que ele não acabe.
Olhas em volta, não tinhas visto ninguém desde que entraste.

Reparas em todos os lugares onde te lembras um dia ter esperado por alguém,num autocarro semelhante, ou mesmo naquele:

Uma grávida, uns 8 meses de gestação, provavelmente. Ela também te olha, e diz-te muito mais do que o que podias esperar.

Um velhinho, com uns 90 anos, olha o chão enquanto chora. Tem uma gravata preta, uma bengala na mão direita, uma flor seca na esquerda.

Uma criança, no colo da mãe. Espirra muito, e a mãe faz-lhe cócegas para a ver soluçar com gargalhadas.

E ele.
Nunca o tinhas visto, nem sabes bem se o que vês existe, porque sempre esperaste que ele aparecesse.
Esqueçes tudo o que ias fazer hoje. Querias que o tempo parasse ali, que a criança não parasse de soluçar, que o olhar daquela grávida congelasse, que a lágrima do velhinho não caísse sem antes chegares para a poderes guardar no teu bolso.
Que ele também estivesse ali, desde sempre á tua espera.

Esperas que tudo fique assim, perfeito. Numa manhã atrasada, com as botas molhadas, de pé, no autocarro. Um acidente lá fora, muita chuva, muita mesmo.


Acordaste. Com remelas nos olhos, cócegas no nariz.
"Quando tocar segunda vez, eu levanto-me..."



26.03.05
*Mó

quinta-feira, março 24, 2005

cala a minha boca...




"toda a gente sabe que a arte é uma forma de magia. O que ninguém sabe é o que é a magia. Torna presente o que está ausente, sem que se saiba como. Acontecem coisas sem que se compreenda por que acontecem e, precisamente, o que menos interessa é saber ou compreender. Fascina e arrepia. Eu andei a brincar com coisas que não devia. Percebi tarde que as consequências do que fazia fugiam por completo ao meu controlo, que a partir de certa altura, bem cedo, não era eu quem jogava, era eu o jogado."

sábado, março 19, 2005

I want you

Oh my baby baby I love you more than I can tell
I don't think I can live without you
And I know that I never will
Oh my baby baby I want you so it scares me to death
I can't say anymore than "I love you"
Everything else is a waste of breath


I want you
You've had your fun you don't get well no more
I want you
Your fingernails go dragging down the wall
Be careful darling you might fall
I want you
I woke up and one of us was crying

I want you
You said "Young man I do believe you're dying"
I want you
If you need a second opinion as you seem to do these days
I want you
You can look in my eyes and you can count the ways
I want you
Did you mean to tell me but seem to forget

I want you
Since when were you so generous and inarticulate
I want you
It's the stupid details that my heart is breaking for
It's the way your shoulders shake and what they're shaking for
I want you
It's knowing that he knows you now after only guessing
It's the thought of him undressing you or you undressing
I want you
He tossed some tatty compliment your way
I want you
And you were fool enough to love it when he said
"I want you"
I want you
The truth can't hurt you it's just like the dark
It scares you witless
But in time you see things clear and stark
I want you
Go on and hurt me then we'll let it drop
I want you
I'm afraid I won't know where to stop
I want you
I'm not ashamed to say I cried for you
I want you
I want to know the things you did that we do too
I want you
I want to hear he pleases you more than I do
I want you
I might as well be useless for all it means to you
I want you
Did you call his name out as he held you down
I want you
Oh no my darling not with that clown
I want you
I want you
You've had your fun you don't get well no more
I want you
No-one who wants you could want you more

I want you
I want you
I want you
Every night when I go off to bed and when I wake up
I want you
I'm going to say it once again 'til I instill it
I know I'm going to feel this way until you kill it
I want you
I want you
I want you


Elvis Costello - I want you.

did I say that I want to leave it all behind?
Não me ouves mais. Se ouvisses, estavas aqui comigo, a suplicar que eu calasse os meus gritos absurdos de te querer tanto.
Quase nem me aguento. Dou por mim completamente insuportável a chorar por dentro, pisada e amarrotda como um papel molhado com gotas de sal e água que deixaram esquecido a secar ao sol numa noite de primavera como esta.

Esqueceste-te de mim.
Mas tu prometeste que ficavas! Prometeste e não cumpriste e agora olho para ti em lado nenhum e vejo-te nos cantos todos onde invento que te vi um dia.

Tu não me ouves mais. Fechaste a porta e deixaste-me do lado de fora, não reparaste que o meu coração entra sempre antes de eu esperar que abram a persiana, agora não me ouves mais! E eu não sei o que fazer para te dizer que tenho o coração dentro da masmorra onde fechaste os meus sonhos, e a chave ficou contigo.
De tanto queimar as mãos na tua campainha chego a sentir que és tu quem me aquece outra vez os dedos, um por um. De não mais sentir as pernas, sentada a porta dessa fortaleza, penso, com as forças que ainda tenho para o fazer, que és tu que, enrolado com as tuas pernas nas minhas, as faz tremer desta forma. O silêncio já me é tao familiar como o são as palavras que nem deste tempo de dizeres, que não me deixaste ouvir e que não soube como te dizer que mas escreveses.
Eu lia-te, também oiço os riscos do teu caderno, até agora.

De tanto ficar deitada no teu passeio, a espera que as estrelas me cantem o som do cristal e das ondas a bater nas rochas que um dia me deixaste ouvir, desenho violinos nas nuvens, peixes dourados no azul fosco quase nublado, e juro-te que oiço patinhos a minha volta. Muitos patinhos, muitos. Muito lindos, todos.

Os dias cheiram aos teus cabelos e o frio que faz de vez em quando, arranha-me a pele e abre frestas como fazias com a barba mal feita. Como quando te vias nos meus olhos, espelhados de ti, saidos de dentro do coração que trancaste atras dessa porta fechada a cadeado.
Não tenho a chave. Nem tenho coração. Nem tenho mais para onde olhar daqui. Quando em cima de mim mora o céu que nos cobriu os passos e os abraços, quando em todo o lado vejo rios e oiço ondas e sinto as pernas a tremer, cheiro os teus cabelos e leio as palavras que nao me escreveste, guardo as musicas todas na garganta e canto para dentro, grito para fora que essa tua masmorra de porta fechada e sem janelas é a coisa mais sincera de todas.
Mesmo que a porta se dissolva nas pedras das paredes, e abras tuneis para fugir, ela fica aqui, a frente dos meus medos, com os meus sonhos la dentro, ao lado do coraçao. E não tenho nada mais sincero que isso.

Não me ouves mais. Vou esperar que essas paredes desabem, e que ainda saiba como eram os sonhos todos no dia em que mos fechaste dentro do sitio onde decidiste morar.

sexta-feira, março 11, 2005

o assobio da cobra

Fruto da imaginação (Quem és Tu?)



Eras tu
Na razão das aves e no sol das manhãs
Eras tu
No correr das águas e na cor das romãs

Como foi
Que perdi o pé no coração
Tu és tudo o que me é dado criar
És um fruto da imaginação

Eras tu
Em todas as praças, em todas as cidades
Eras tu
Na paz do silêncio depois das tempestades

Quem és tu
Que andas com a lua na algibeira à espera que eu vá
Quem és tu
De perna traçada no meu sonho como se fosses de lá

Como foi
Que perdi o pé no coração
Tu és tudo o que me é dado criar
És um fruto da imaginação



João Monge

terça-feira, março 08, 2005

Era assim que eu sonhava a mulher. Era assim:
Corpo de fascinar, alma de querubim;
Era assim: fronte altiva e gesto soberano,
Um porte de rainha a um tempo meigo e ufano,
Em olhos senhoris uma luz tão serena,
E grave como Juno, e bela como Helena!

Machado de Assis

sábado, março 05, 2005

não vou cair no erro de inflamar o que dói demais.
afasto-me.

escrevo em silêncio, ja nao calas a minha boca com a tua.

quinta-feira, março 03, 2005

Vi depois, numa rocha, uma cruz,
E o teu barco negro dançava na luz
Vi teu braço acenando, entre as velas já soltas
Dizem as velhas da praia, que não voltas.



Amália - barco negro

quinta-feira, fevereiro 24, 2005

Did U see it?


Paul Klee - "the golden fish"

quarta-feira, fevereiro 23, 2005


"and she's buying a stairway to heaven"...

domingo, fevereiro 20, 2005





Pisei os dedos dos teus pés com os meus quando dançámos ontem à alvorada.
Por entre o restolho, amarraste os cordões dos meus sapatos com as cordas das tuas botas de inverno, que compraste num dia em que ainda não me tinhas visto. Eu já te sabia assim tão encantado, só não sabia onde te encontrar.

Deixei a mochila aberta...num dia qualquer desses em que me viste sorrir como se o sol todo me saísse dos olhos (todos os dias aordei a acreditar que nesse dia esbarrar-me-ia contigo).

E não sabia quem eras tu.

-Tens a mochila aberta, deixaste caír isto.

Agora contas-me que foi assim que nos conhecemos. Não me lembro de te ter ouvido nesse dia, mas cada vez que te oiço agora, sinto que foi com a tua voz que me adormeceram quando sonhei pela primeira vez.

Dá-me colo! E faz-me mimos como quando eu era pequenina e só dormia com sussurros e baloiços ensaiados, como nas noites todas em que fui ficando um bocadinho mais bailarina, daquelas com os cabelos bem compridos, com brilhantes no rosto e um sorriso de quem tem o sol na alma... o brilho dele nos olhos...(piso-te os pés quando danço com os sapatos atados a ti).

-Tens a mochila aberta...

Canta-me as palavras. Não me contes a verdade, deixa-me acreditar que te encontrei sem saber que sempre exististe mesmo antes de saber de ti.

Sei de cor a tua voz, como as rolas que sabem cantar assim que acordam.
Mas continua a cantar.
Quero adormecer com cócegas nos ouvidos.

...Arrepias-me.

És lindo. Muito lindo.


*Mó
12.02.05

sábado, fevereiro 19, 2005

If U believe in love at first sight, U never stop looking


 

And so it is
Just like you said it would be
Life goes easy on me
Most of the time
And so it is
The shorter story
No love, no glory
No hero in her sky

I can't take my eyes off of you
I can't take my eyes off you
I can't take my eyes off of you
I can't take my eyes off you
I can't take my eyes off you
I can't take my eyes...

And so it is
Just like you said it should be
We'll both forget the breeze
Most of the time
And so it is
The colder water
The blower's daughter
The pupil in denial

I can't take my eyes off of you
I can't take my eyes off you
I can't take my eyes off of you
I can't take my eyes off you
I can't take my eyes off you
I can't take my eyes...

Did I say that I loathe you?
Did I say that I want to
Leave it all behind?

I can't take my mind off of you
I can't take my mind off you
I can't take my mind off of you
I can't take my mind off you
I can't take my mind off you
I can't take my mind...
My mind...my mind...
'Til I find somebody new


(Damien Rice - The Blower's Daughter)


 

...GDT...muito.

sexta-feira, fevereiro 18, 2005

dança comigo a primeira valsa...


 

Dança comigo a primeira valsa
Da Primavera
Dança sem sonhos, esquece as promessas,
Ninguém nos espera

Já enchi os dias de lutas vazias,
Estou gasto, cansado, dormente
E a um pouco de sexo ou muita poesia
Ainda não fico indiferente

Fala comigo na palavra falsa
Da fantasia
Chovem amigos na festa da praça
Do meio-dia

É certo que as flores parecem maiores
Que toda a virtude do mundo
Com um pouco de sexo ou muita poesia
Ainda me sinto profundo

Se este mundo fosse feito para ser doce
Eu seria doce fosse eu quem fosse


Foge comigo na última volta
Da maratona
Nada comigo num lago indeciso
De metadona

Já deixei as asas na cave da casa
E as chaves no fundo do mar
Com um pouco de sexo ou muita poesia
Ainda nos vamos casar


Quinteto TATI - "valsa quase anti-depressiva"

um dia dançamos até ao fundo dos dias...e das noites...e dos dias que ficam noites e das noites que ficam dia...um até ao outro...

eu e nós, e tu e nós.
e o mundo todo por trás.

*Mó

quarta-feira, fevereiro 16, 2005

trazias um cúmplice com sabor de uva e mel.

Tento ver onde é que se esconde o meu reflexo na pele côncava do copo.

Ontem, naquele abraço das pedras atrás de nós (onde nos escondemos, sem reflexo), não pensamos em correr atrás de nada. Tínhamos tudo na palma das mãos, em cima da pele côncava dos olhos.
Vi-me quando chegaste perto e tão perto te apertei para que não mais perdesse o meu lugar no sítio onde escondes as lágrimas e os silêncios dos sorrisos.

Éramos dois bonecos de pano... com veludo nas mãos, algodão nos cabelos e cabos de aço amarrados à nossa volta. Colados, atados com nós que fizemos tão bem feitos que cada gesto dado os reforça, atiçados e embrulhados de uma forma tão simples que é desnecessário qualquer estratagema de os desatar - nenhum funcionaria.

Tínhamos os mundos todos e as galáxias todas. Tínhamos recantos para os segredos, enrolados um no outro, sem saber onde existia o resto que não éramos nós.

Trouxeste um cúmplice, vermelho negro, com trago de mel e uva - com trago de uva e desejo de mel. Como os acordes dos teus sacrilégios e dos meus previlégios de beber dos teus segredos.

Existem noites assim...perfeitas.
Em que se cortam as mãos e se arranha a pele com a barba áspera (reparaste como cantam os pedaços da minha pele por onde tu passas?), em que se raspam os joelhos no granito esculpido só para nós.

Existem noites em que se fazem paredes e tectos de vapor e o frio não toca em nós, em que temos tudo mais especial que o sonho...em que o sonho é só o resumo quase inócuo da magia toda que nos viram encontrar.

Não vieram as carruagens, nem os cavalos brancos, e nem eu tinha um vestido bordado a ouro. Não havia orquestra de gente, nem um bailado onde as donzelas aprendem a voar. Não soubemos das bruxas nem das madrastas malvadas... confesso que não vi sequer a fada madrinha.

Mas vi-te a ti. E vi-te tão perto que bloqueei no relógio que fica eternamente no último segundo da décima primeira badalada.
O feitiço assim não quebra, e eu não tropeço na escada...esqueço o sapatinho.

Hoje sei, ao procurar o meu reflexo escondido no copo, que não se inventam histórias nem se pedem histórias já inventadas quando se vive o que nós vivemos - com corpo, com alma, com granitos esculpidos e ventos desviados.

Quando estamos perdidos, encontrados depois do espaço que não é nosso.

Quando trazes um cúmplice, que sabe a uva e a mel.

Quando, ao invés de tropeçar na escada, se galgam os medos e se bebem segredos num copo de cristal.


15.02.05
*Mó

segunda-feira, fevereiro 14, 2005


pão, vinho e beijos... eu e tu. 

coimbra... 

sábado, fevereiro 12, 2005


"parece que foi desenhada com um aparo..." 

sexta-feira, fevereiro 11, 2005

porto de abrigo.


porto de abrigo 

Um dia, saí pela janela do quarto e saltei da varanda para o jardim. Trepei o muro, piquei a mão num arame farpado esquecido e fiquei de pé, a tremer ao portão.
A lua era vaza, "como se fosse desenhada com um aparo", daqueles bem rigorosos e fabulosamente indefinidos. Alguém a riscou lá, imperfeita, "incrível", como tu dizes...

Não tinha cobertores nem pedaços de pele destapados para dar beijos...não tinha estrelas para contar até vinte com os olhos muito fechados e depois brincar às caçadinhas.
Tinha o corpo quieto, a tremer ao portão, com a mão furada no sítio das chagas. E isso é tanto quando, ao fechar os olhos se conta até 10, se tropeça no 11, e ao segundo preciso do 12, quase no 13, alguém nos faz cambalear quando nos toca o pulso.

Ficam para trás os portões e os arames. As marcas são outras, maiores que as da mão furada.

E as estrelas?
Contadas a dobrar não se atrevem a não aparecer.


10.02.05
*Mó

M M M... um percurso.


 


"GDT pareceu-me bem"...MMM é coisa de filme...Mas a caixinha de música ainda toca, na tela daquele cinema (última sessão) e nas minhas mãos.

Histórias de amor não são ilusões, "mon amour".